quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Atendimento Pré-Hospitalar: a Formação Específica...

Atendimento Pré-Hospitalar: a Formação Específica do
Enfermeiro na Área e as Dificuldades Encontradas no Início
da Carreira

INTRODUÇÃO

O Atendimento Pré-Hospitalar (APH) teve
início há mais de 30 anos na América do Norte e Europa,
apresentando notável expansão logo após a Guerra do
Vietnã (1962-1973), quando as autoridades norte-americanas
perceberam que a atuação de socorristas nos locais
de batalha e nos transportes para hospitais reduzia significativamente
a mortalidade e aumentava o tempo de
sobrevida dos soldados feridos(1).

O APH caracteriza-se como o conjunto de medidas
e procedimentos técnicos que objetivam o suporte de
vida à vítima, podendo ser básico ou avançado,
estabelecendo-se padrão vital que mais se assemelhe à
normalidade, tendo como conceito supremo não agravar
lesões já existentes ou gerar lesões que não existiam
(iatrogenias), bem como transportar a vítima\paciente\
cliente para o centro hospitalar terciário apropriado ou
centro de trauma credenciado(2).

No Brasil(1),o APH foi regulamentado somente
em 1989, devido ao surgimento oficial do serviço de
atendimento às emergências médicas – resgate na cidade
de São Paulo, sendo inicialmente desenvolvido segundo
os moldes norte-americanos e operacionalizado prioritariamente
pelo Corpo de Bombeiros.

No final da década de 1990, tendo como pano
de fundo interesses do Conselho Federal de Medicina,
passou-se a questionar os serviços de APH do Corpo
de Bombeiros operados por “socorristas”, até então
carentes de embasamento legal para a atuação. A p a r t i r
desse período, ocorreu a inserção da categoria
médica nos serviços de APH, cabendo, segundo a
Resolução nº1.529/98( 3 ) ao Corpo de Bombeiros e
outros militares somente a atuação breve no Suporte
Básico de Saúde( 4 ).

A Resolução nº. 1.529/98 (3) determinou, ainda,
que a regulação dos serviços de APH seria de competência
médica, estabelecendo quais profissionais estariam
aptos a atuar no APH (oriundos e não oriundos da
área da saúde), bem como a formação necessária para
esses profissionais, delimitando, inclusive, o conteúdo
curricular para cada categoria.
Frente a esse quadro, o Conselho Regional de
Enfermagem do Estado de São Paulo, através da Decisão
001/2001(5) de 22 de março de 2001, regulamentou as
atividades de enfermagem no APH e demais situações
relacionadas com o suporte básico e avançado de vida
resolvendo que “o Atendimento Pré-Hospitalar, de Su -
porte Básico e de Suporte Avançado de Vida, em termos
de procedimentos de Enfermagem, previstos em lei
sejam, incondicionalmente, prestados por Enfermeiros,
Técnicos de Enfermagem ou Auxiliares de Enfermagem,
o b s e rvados os dispositivos constantes na Lei nº
7498/86(6) e Decreto-lei 94.406/8 (7)”. Em 12 de julho de
2001, no intuito de legitimizar as atividades de enfermagem
no atendimento Pré-hospitalar, o Conselho Federal
de Enfermagem, através da Resolução nº 260/2001(8),
fixa como especialidade de Enfermagem e de competência
do enfermeiro o atendimento pré-hospitalar, sem,
no entanto, especificar sua formação e ações.
1 Professor Doutor do Curso de enfermagem da Universidade de Ribeirão Preto-UNAERP
Especialista em Enfermagem em Terapia Intensiva pela Sociedade Brasileira de Enfermeiros de Terapia Intensiva- SOBETI.


Atendimento Pré-Hospitalar: a Formação Específica do Enfermeiro na Área e as Dificuldades Encontradas no Inicio da Carreira
Rev Paul Enf 2006; 25(1):38-43. 39
Somente em 2002, através Portaria nº 2048 do
Ministério da Saúde, de 05 de novembro de 2002(9), que
regulamenta e normatiza o APH, são definidas as funções
do Enfermeiro, o perfil desse profissional bem como de
toda a equipe que deve atuar nesse serviço. Nessa
Portaria(9) os enfermeiros de APH são responsáveis pelo
atendimento de enfermagem necessário para a reanimação
e estabilização do paciente, no local do evento e
durante o transporte. Cabe também ao enfermeiro, “prestar
serviços administrativos e operacionais em sistemas de
atendimento pré- hospitalar, supervisionar e avaliar as
ações de enfermagem da equipe no atendimento préhospitalar
móvel, dentre outras funções específicas.

No que se refere ao perfil do profissional
enfermeiro que atua no APH, a Portaria nº 2048(9) orienta
que deva ter iniciativa, estar preparado para trabalhar em
conjunto com a equipe; tomar decisões rápidas, embasadas
em conhecimentos prévios e protocolos de atendimento,
sendo essas últimas fundamentais para o sucesso
da ação. Além disso, a referida portaria faz alusão também
a algumas características psíquicas desse profissional.
Menciona que o autocontrole e equilíbrio emocional
são fundamentais para agir sob pressão e estresse; pois
muitas ações são realizadas em ambientes perigosos com
pouca iluminação ou espaço.

O atendimento pré-hospitalar regulamentado e
assegurado por lei, teve como conseqüência a expansão
de oferta de trabalho incluindo o enfermeiro nessa área,
a qual passou a absorver a mão-de-obra deste profissional.
Atualmente se exige do enfermeiro de APH, além
de sólida base de conhecimentos técnicos específicos,
outros fatores de igual importância, como a capacidade
de autocontrole e autocondução(10).
Frente ao exposto, percebe-se a exigência de
características e habilidades específicas do enfermeiro
para atuar em APH. Esse fato é preocupante principalmente
quando se verifica que o conhecimento relativo
ao APH especificamente, não esta integrado no conteúdo
das disciplinas curriculares dos cursos de enfermagem.
Apesar de existirem no mercado hoje vários
cursos que visam desenvolver as técnicas utilizadas no
APH, e ainda colocar o enfermeiro frente a situações
inesperadas, tais como o Advanced Cardiac Life Suport
(ACLS), Advanced Trauma Life Support (ATLS), Préhospital
Trauma Life Suport (PHTLS), Basic Life Sport
(BLS), MAST (Manobras Avançadas De Suporte Ao
Trauma), alguns destes cursos não suprem a necessidade
de formação específica do profissional para o Atendimento
Pré-Hospitalar, pois, na maioria das vezes, desenvolvem
os conteúdos em salas de pronto-socorro, onde
existe o suporte tecnológico para o atendimento como
equipamentos, profissionais treinados, materiais específicos,
exames subsidiários, o que nem sempre retrata a
realidade do ambiente pré-hospitalar(11).

A pouca atenção dada à formação do enfermeiro
para atuar em urgências e emergências talvez seja reflexo
do próprio sistema de ensino de enfermagem no Brasil,
que adota um modelo de ensino e pesquisa de influência
norte americana, o qual segue uma visão integralista. Vo l t ado
para as políticas de extensão de cobertura e de atenção
primária em saúde, nesse contexto, a formação do enfermeiro
generalista centra o ensino nas competências das
diversas áreas de atuação do profissional, ou seja, capacita
o enfermeiro para a assistência individual e coletiva
dirigida à criança, mulher e adulto, nas áreas de enferm agem
clínica cirúrgica-obstétrica, ginecológica, pediátric a ,
psiquiátrica e administração hospitalar e dos outros serviços
básicos( 1 2 ). Além disso, na maioria dos cursos de enfermagem,
há grande preocupação em oferecer muita informação,
em detrimento da formação e do desenvolvimento
das capacidades de trabalhar com essa informação( 1 3 ).
Pode-se inferir então que há algumas lacunas no
que se refere à formação de enfermeiros para atuação no
APH, pois, de um lado tem-se a legislação apontando a
necessidade de um profissional de APH especialista em
sua área de atuação com experiência e competência; e de
outro lado há formação de enfermeiros generalistas,
oriundos de universidades que procuram atender as exigências
de um modelo integralista de assistência. Talvez
esse cenário, se constitua hoje num grande desafio na
formação de enfermeiros para atuarem no APH.
Não se quer dizer aqui que a universidade deva
desviar seu foco. O que se procura é conhecer o contexto
de trabalho no qual se encontra o enfermeiro de APH,
tendo como referência o seu preparo para a atuação,
frente ao conhecimento sobre APH recebido durante a
sua formação profissional.

Nenhum comentário:

Postar um comentário